sábado, 26 de agosto de 2017

Culto Pagão

Sermão para ordenação pregado em Março de 2006 no presbitério Centenário na Igreja Presbiteriana do Jaraguá em Belo Horizonte.

Texto Básico
Romanos 12.1-2
1  Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.
  1. E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.

Existe uma ideia oposta ao "culto racional" a que Paulo tenta demonstrar aqui neste texto. Essa ideia contrária podemos chamar de um culto pagão.
    O termo “pagão” tem por significado básico aquilo que é da terra, aquilo que seja natural da terra. No contexto religioso, tem por significado aquilo, ou alguém que ainda não sofreu alguma mudança radical pela chegada do evangelho. Culturas que ainda não receberam, ou não aceitaram o evangelho de Jesus Cristo como sendo a verdade, e ainda continuam a adorar qualquer divindade que seja natural, ou que tenha haver com elementos da natureza, inclusive o homem, são consideradas pagãs.
Os cultos pagãos se dirigem a várias entidades, tantas que não se pode enumerar. A cultura pagã chegou a adorar mais de 300 milhões de deuses em uma única religião. Existem deuses para serem adorados de todos os gostos, e de todos os desígnios, tantos quantos forem os desígnios do coração humano.
    O conceito a respeito do que era considerado pagão começou a mudar com o surgimento, no século XVIII, com a chegada do Iluminismo. Um movimento cultural-sociológico e filosófico que adentrou o mundo para não mais sair. Foi assim chamado pelo seu conceito de que as novas técnicas de se adquirir o conhecimento iluminariam as consciências, até então obscuras.
Na era medieval que perdurou até bem próxima à reforma não se discutia a existência ou não de Deus, simplesmente era crida a sua existência, e ainda: entre o que era considerado pagão e o que era considerado sagrado eram muito bem distintos.
Hegel, que foi expoente do iluminismo, disse que tudo o que existe deveria ser experimentado, e provado pela razão humana. Como Deus não pode ser experimentado desta maneira por aqueles que não nasceram de novo, a existência de Deus foi posta em discussão. Desta forma aquilo que antes era considerado pagão, passou a ser visto com outros olhos, os olhos da razão humana.  
    A partir deste movimento mudou-se a maneira de pensar. Não existe mais única verdade, pois se a verdade deve ser experimentada, então a experiência de cada um provará, ou não esta ou aquela verdade somente para aquele que a experimentou. Um sorve um conceito de modo diferente de outro, assim um único conceito passa a ter dois níveis de aceitação, e por conseguinte, dois níveis de entendimento.
    Este pensamento está na igreja de Jesus Cristo, sua noiva, a igreja invisível, não a triunfante, mas na militante. Até a idade média não havia disputas teológicas acirradas em torno da sagrada Escritura dentro da igreja, nem quanto ao culto que se deveria prestar a Deus. A discussão existente era da Igreja Católica, (universal), Apostólica contra os pagãos. Muitos erros foram cometidos nesta grande disputa surgida antes da reforma, um dos erros foram as Cruzadas. Em nome de Deus, homens com a promessa de perdão de todos os pecados, inclusive os que haveriam de cometer ainda, mataram, e mataram, e mataram, os que eram considerados pagãos.
    Após o evento da Reforma tudo mudou, não só dentro da igreja, mas o embrião do iluminismo que colocou em cheque os absolutos, bem como os paradigmas do que era pagão e do que era sagrado, morreram ali. A Igreja com os seus dogmas absolutos foram colocados em dúvida. Os reformadores tinham a intenção de voltar às Escrituras, voltar a absoluta verdade da Palavra de Deus. Um efeito colateral deste movimento põe abaixo todo o sonho da reforma.
Por que os reformadores discordaram da Igreja Católica, voltando-se para a Escitura, outros se acharam no mesmo direito de discordar dos reformadores; uma avalanche, sem precedentes, de novas religiões e denominações começaram a surgir, cada uma com sua verdade. É claro que muitos dos  reformadores não queriam dividir a Igreja, pelo contrário queriam reforma-la, e não dividi-la multiplicando a interpretação bíblica e os modos de culto de forma exponencial.
Nesta miscelânea de interpretações surge um grupo que disse: “Vamos estudar a Palavra com afinco a fim de obter uma linha de interpretação mais coerente com a própria Palavra, bem como traçar um paradigma de culto”. Como resultado do estudo de cento e cinqüenta doutores e mestres na palavra que perdurou quase sete anos surge a Confissão de Fé de Westminster, que nada mais é do que uma direção para interpretar a Palavra de forma mais consistente e coerente com ela própria.
A história nos ensina que esta linha de interpretação está caindo desacreditada, isso por que cada um tem a sua verdade, cada um tem sua linha de interpretação da Escritura, cada um tem a sua hermenêutica, cada um interpreta o que quer, cada um cultua a Deus do jeito que quer, cada um vive a vida do jeito que se sente melhor e interpreta a Escritura de mesma forma. Não existe mais parâmetro de interpretação, estamos no cerne do racionalismo de Kant, não existe mais absoluto, não existe mais verdade, o que existem são verdades.
Como resultado desta história, os cultos ocorrem nas igrejas de modo completamente diverso. Mas qual a verdadeira essência do culto a Deus? É pular? Gritar? Chorar? Bater palmas?  Ficar plácido? Em silêncio? Demonstrar contrição? O verdadeiro ato de culto qual é? Tenta-se responder a estas questões da mesma forma que Hegel propôs: com base na experiência: “...mas o fulano sentiu isso!”; “...esta menina vivencia isso todos os dias dela lá na missão...”; “eu fui muito abençoado com isso, e espero que você também seja...” O culto a Deus tendo a experiência como parâmetro de interpretação para a vida dos crentes não passa de uma aberração. É claro que as pessoas têm, e devem ter experiências pessoais com Deus, mas estas experiências não podem ser nunca o modelo de culto, ou ainda, regra de vida para outros.  
Paulo isso ao escrever sua carta aos Romanos fala sobre isso..quando ele roga não pela misericórdia de Deus, mas por causa da misericórdia que Deus teve de nossas vidas salvando-nos de nossa perdição causada pelos nossos pecados... Por isso é que devemos nos atentar a uma vida santa e inabalável diante de Deus que é  o nosso  culto devido à Deus. Todas as nossas ações, toda nossa  vida deve ser centrada em demonstrar a gratidão pela misericórdia de Deus, através de nossas ações e nossa moral que devem estar sintonizadas uma com a outra, e que estas provém de Deus, não de nós mesmos. Cf. cap. 11.30-36  30 Porque assim como vós também, outrora, fostes desobedientes a Deus, mas, agora, alcançastes misericórdia, à vista da desobediência deles, 31 assim também estes, agora, foram desobedientes, para que, igualmente, eles alcancem misericórdia, à vista da que vos foi concedida. 32 Porque Deus a todos encerrou na desobediência, a fim de usar de misericórdia para com todos. 33 Ó profundidade da riqueza, tanto da sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis, os seus caminhos! 34 Quem, pois, conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi o seu conselheiro? 35 Ou quem primeiro deu a ele para que lhe venha a ser restituído? 36 Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém!
Muitos tem uma vida moral exemplar, contudo sem nenhum fundamento, são simplesmente moralistas. Paulo adverte que este fundamento deve ser o reconhecimento da misericórdia que Deus teve de nós. E aqueles que tem essa moral vazia jamais poderão cultuar a Deus de forma correta, de forma decente. Não terão temor de Deus, muito menos pela sua Palavra. Por que a moral em que baseiam suas vidas é uma moral infundada, sem raízes.
Muitos dos ouvintes de Paulo a quem ele endereçou a carta, aos romanos, viviam sob a regência de uma vida não regenerada, e possuidores de uma moral avassaladora que impunha pesos à vida de outros que estes não podiam suportar. Por isso a advertência feita por ele no cap. 11. 6.  E, se é pela graça, já não é pelas obras; do contrário, a graça já não é graça
Paulo lembra no cap. 11.2 Deus não rejeitou o seu povo, a quem de antemão conheceu. Ou não sabeis o que a Escritura refere a respeito de Elias, como insta perante Deus contra Israel, dizendo: Senhor, mataram os teus profetas, arrasaram os teus altares, e só eu fiquei, e procuram tirar-me a vida.  Elias havia se oposto à sua nação, por que a religião e o culto a Deus haviam desaparecido de vez do meio de Israel. O erro de Elias foi de condenar toda a nação excetuando a ele mesmo. E Deus falou que não, que havia um fiel remanescente.
Paulo fala que as obras não conduzem à salvação. Uma vida cheia de moralidade sem fundamento leva ao inferno. Mas quando a vida é uma vida de culto a Deus e a moralidade vem por causa da transformação gerada pelo Espírito de Deus, aí temos uma verdadeira vida, um verdadeiro culto.  podemos até distinguir dois tipos de culto:
1. Um é a minha vida centrada em Deus e nas suas Leis como reconhecimento da misericórdia de Deus,
2. e o outro culto é continuação deste primeiro, que o momento em que todos os crentes se reúnem em um determinado local onde juntos expressarão a glória de Deus. Nesta noite não vamos enfocar um tipo de culto, mas culto como acabamos de definir, a vida e o momento quando nos reunimos, por que um é extensão do outro, não tenho como desvencilhar um do outro, pois são a mesma coisa. Mas este culto não pode ser feito de qualquer maneira.  Então qual o princípio de culto que agrada a Deus?                                                                                                                                            
1 - O culto deve ser racional
  1. Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.

Os cultos de hoje mudaram extremamente em relação ao passado, no tocante a essência, no tocante a abrangência. Os cultos não são para exaltar Cristo e seu sacrifício. Não se prega sobre o pecado; não se fala em santificação; mas se prega uma mensagem positivista, onde temos de ser curados, temos de ser melhores pais, melhores maridos, melhores filhos; temos de ter mais dinheiro, afinal somos filhos do Rei; enfim entroniza-se o culto enfatizando como devemos sair melhores do que somos; melhores do que realmente podemos ser.
Não que isso não seja possível, ou impossível, mas a tônica do culto passou a exaltar o que o homem pode ser, e não o que ele realmente é em vista do Criador: Seres humanos “totalmente depravados” carentes da glória de Deus, como pecadores que somos. A imagem do “eu melhor” é exaltada diminuindo a glória de Deus. As pessoas vão aos cultos com sentimentos egocêntricos tentando adorar a Deus à sua própria maneira, segundo sua própria cultura, como se o culto a Deus fosse uma manifestação cultural, e não um ato público onde Deus mesmo já determinou na Escritura como este culto deva ser feito.   
Mas durante o culto, ao som das músicas os ouvidos embalam timbres ao sistema nervoso que impulsionam mãos e pés; e o culto começa a parecer uma libertação de adrenalina retida, inclusa, recalcada, tirando o foco da adoração a Deus para focalizar aquilo que “eu gosto”, “aquilo que me satisfaz”, sendo que o que Deus procura não é a expressão física de louvor, ele procura verdadeiros adoradores que o adorem em “Espírito e em verdade”. João 4:23  Mas vem a hora e já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque são estes que o Pai procura para seus adoradores.  
Desta feita, tudo mais é supérfluo, é exagero e se torna desprezível. O que importa é a essência e não a exteriorização de impulsos hormonais, ou a expressão do próprio gosto pessoal, a que muitas vezes somos enganados a crer que esses agradam a Deus, quando na verdade estamos imitando o mundo na sua forma de colocar para fora tudo aquilo que lhes agrada.
Estamos imitando ao mundo, seja cantando, seja ritmando, pulando, exaltando, colocando para fora tudo aquilo que poderia me deixar mais pesado e me tornando mais leve, leve por que pus para fora tudo o que estava sentindo, e não o que realmente sou, e o que Cristo é.
O culto de louvor e adoração à Deus, como bem lembrado, certa vez, por um irmão hoje pela manhã, “o culto não pode ser feito com os mortos, por que os mortos não louvam a Deus”. Desta forma, quando o culto solene acontece, este culto não tem o objetivo de agradar ao visitante ou ao membro. O culto é o encontro do noivo, Cristo, com a sua igreja viva, a noiva.
Imagine a cena: Cristo, o noivo, no altar aguardando sua igreja, a noiva chegar. De repente alguém lhe diz que a noiva está às portas para entrar e se encontrar com Ele. Existe então uma expectativa no coração do noivo. Ele quer ver sua noiva linda, vestida de branco, com véu sobre a cabeça demonstrando todo o respeito que Ele merece entrar pelas portas da igreja; e de forma singular desfilar amorosamente e com todo o recato e pureza. Mas quando ela aparece na porta, ela está seminua, mostrando partes íntimas de seu corpo. Entra pela igreja dançando, fazendo malabarismos, e de repente dá um salto mortal e cai de pé ao lado do noivo. Que modo de se apresentar a Cristo?
A Bíblia nos dá exemplos de pessoas que eram tidas como servas de Deus inserir elementos estranhos no culto.   o falar do incenso estranho.
LEVÍTICO  10.1. Nadabe e Abiú, filhos de Arão, tomaram cada um o seu incensário, e puseram neles fogo, e sobre este, incenso, e trouxeram fogo estranho perante a face do SENHOR, o que lhes não ordenara. O problema não era o fato de trazer incenso diante do Senhor. O culto para o AT continha este elemento que era o incenso. O problema residiu na não observância de Nadabe e Abiú de fazer o culto conforme Deus havia preceituado de forma clara. Os dois irmãos quiseram simplesmente trazer uma pequena inovação ao culto modificando um pouquinho o culto, mudando apenas, talvez, o perfume do incenso, um novo cheiro apenas. Foram mortos, por que Deus requer que o nosso culto seja conforme Ele requer, e não da forma que achamos que Ele queira.
O culto a Deus não precisa de elementos adicionais da cultura, ou da tradição, nada disso, mas unicamente que tenhamos vida santa diante de Deus. Um “culto racional fundamentado na vida de adoração a Deus onde o termo racional é logikov  - que concorda com a razão, que segue a razão) lóogiken, é um culto lógico de uma vida coerente com aquilo que professa ser, coerente com a razão que se possui da verdade bíblica.
É sobre estas coisas que Paulo falou em Romanos 8.4,5;  “que não andemos segundo a carne, mas segundo o Espírito de Deus que habita em nós”.
Esta é a essência do viver de adoração à Deus e que deve ser trazida para o momento de culto. Culto fala não de como eu gosto cantar ou louvar, mas culto trata de como Deus quer que vivamos e o cultuemos a Ele. Desde o princípio da Criação Deus mostrou ao homem quem Ele era, o que Ele fez, com a intenção de fornecer ao homem a própria maneira de como se relacionar com Deus e esta forma é obedecendo.
Deus nos deu regras para a viver...e da mesma maneira regras de como realizar um culto em adoração à Deus... observe que é bem diferente daquilo que Isaías disse: ISAÍAS  29.13. O Senhor disse: Visto que este povo se aproxima de mim e com a sua boca e com os seus lábios me honra, mas o seu coração está longe de mim, e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de homens, que maquinalmente aprendeu, quando afirmo que Deus nos deu regras para o culto eu não estou falando de regras humanas, mas a própria maneira de culto que Deus exige de forma clara e expressa na Escritura de como deva ser esse culto. Isaías aponta para a distorção destas regras bem como Jesus dizendo que os fariseus haviam distorcido o culto, distorcido os mandamentos divinos transformando-os em tradicionalismo humano invalidando a Palavra de Deus. Colocando a tradição, a cultura acima do que está preceituado na própria Escritura, pervertemos o culto.
Lembremos que Paulo nos adverte que o culto, a adoração, o viver cristão não deve ira além daquilo que está escrito na Palavra:
I CORINTIOS  4.6. Estas coisas, irmãos, apliquei-as figuradamente a mim mesmo e a Apolo, por vossa causa, para que por nosso exemplo aprendais isto: não ultrapasseis o que está escrito; a fim de que ninguém se ensoberbeça a favor de um em detrimento de outro.
Quando nós inserimos manifestações de qualquer espécie que não estão preceituadas de forma clara na Escritura sobre tudo o que se pode realizar em um culto eu estou ultrapassando a Escritura... Quando eu começo a dar significados diferentes às palavras fora do contexto histórico bíblico, eu estou indo além da Escritura... Quando eu começo a querer viver segundo a tradição humana que fere a Escritura estou indo além da Escritura... Sabe como isso é chamado por aí? "Estamos engessados.."
Quando eu quero fazer o culto à minha maneira e começo a usar como argumento de que o culto a Deus não pode ser engessado, deve ser mais livre, mais solto... isso demonstra uma clara rebeldia às próprias regras que a Escritura trás sobre como Deus deseja ser adorado. E a manifestação é sobre como eu acho que deve ser o culto. Em outras palavras: vou adorar a Deus da minha maneira, por que eu sou assim. É desta forma que você, cristão evangélico, pratica a idolatria, por que você NÃO faz a adoração de acordo com o Deus revelado na escritura, E CONFORME DEUS REQUER, mas pratica a adoração e faz o culto conforme você quer. Ou seja, você é idólatra de si mesmo. Seu culto não é nem um pouco diferente dos milhões de cultos pagãos existentes pelo mundo afora.  
Quando Paulo afirma “não ultrapasseis o que está escrito” a própria Escritura nos põe limites... gessos.. Quando Deus afirmou: Sede santos como eu sou Santo... Deus mesmo afirmou. Em outras palavras Ele afirma: “vocês tem limites para o que devem fazer em um culto, em uma vida de adoração...”
O nosso limite, a nossa linha divisória, a nossa cerca que tem o aviso: "Perigo não ultrapasse" ou o nosso gesso que limita o que podemos fazer, é a lei de Deus que mantêm este aviso para nossa própria segurança. A linha divisória marca o limite entre o viver santo, e o viver profano... o gesso que limita nossos movimentos é para que nossa essência pecaminosa que é o nosso osso quebrado no Jardim do Éden,  nos mantenha de pé diante de Deus; a cerca que diz cuidado, não ultrapasse, é a cerca que nos protege de não viver em pecado, e nos protege de tentar agradar a Deus à nossa própria maneira. É a cerca que nos impede de realizar um culto pagão mesmo que seja como pequenas modificações como fizeram Nadabe e Abiú, ao invés de realizar um culto de fato consagrado ao Senhor.  
Ao escrever para os coríntios Paulo fala acerca do uso dos dons dentro da igreja. No capítulo 12.7   “A manifestação do Espírito é concedida a cada um visando a um fim proveitoso.”  Nada que possa a vir acontecer no culto poderá ser descartável, tudo tem de ter uma serventia. Quando estivermos em um culto, pergunte-se a si mesmo. O que estamos fazendo agora pode ser descartado do culto? Se pode algo que fazemos pode ser descartado, então nosso culto pode ser reestruturado, e melhorado. Melhorado não no sentido de acrescentar mais coisas, contudo deixar somente os elementos essenciais fazerem parte do culto.
E se algo que queremos implementar no culto, é algo que podemos afirmar que isso NÃO é essencial, NÃO é básico no culto à Deus, então não devemos inserir no culto.
Na igreja de Corinto tinham pessoas que falavam em línguas, e outros em profecias. Para esses, Paulo advertiu que só poderiam falar em línguas dentro da igreja se houvesse intérprete; e se houvesse uma reunião solene com visitantes, lhes era proibido falar em línguas como se vê em I Co  14.23 - Se, pois, toda a igreja se reunir no mesmo lugar, e todos se puserem a falar em outras línguas, no caso de entrarem indoutos ou incrédulos, não dirão, porventura, que estais loucos?”.  
E para aqueles que profetizavam, em Corinto, havia a regra que cada um esperasse a sua vez, não poderiam falar todos ao mesmo tempo. Por que ambos tinham domínios de suas faculdades mentais enquanto profetizavam ou oravam em línguas. Não se entra em um êxtase no qual não se tem um domínio da própria razão. 14.32 “Os espíritos dos profetas estão sujeitos aos próprios profetas;” no culto a racionalidade do ser humano não fica apagada.
Cf. 14.40 - O culto enfim deve ser feito com decência e com ordem, ou seja tem de ser racional.

  1. – Não tomem o molde do mundo
E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.
   
Perceba que vimos ao final do ponto anterior que sendo o culto racional devemos filtrar aquilo que vem do mundo natural, do que é mundano, daquilo que é pagão, cultural e o nosso filtro é a Escritura usando a razão. O culto não pode tomar a forma do mundo, para que não se torne um culto irracional, e desprezível, mundano, pagão.
A palavra século aqui, neste versículo, é a mesma palavra para mundo. Paulo está dizendo: “E não vos conformeis com este mundo
Paulo fala deste tema a ponto de suplicar aos romanos que se diferenciem do mundo, que se diferenciem de sua época de seu mundo cf. 12.1-2.  Isso ele suplica por que se tomarmos o molde do mundo, o molde da tradição, o molde da cultura, o nosso culto já não é racional, já não podemos adorar em espírito e em verdade, estaremos adorando conforme a ideia do mundo, não conforme os limites traçados na própria Escritura.
A tomada dos moldes, ou seja, conformar, tomar a forma do mundo pela igreja, e esta pelos seus membros, conformar-se (i.e., mente e caráter de alguém) ao padrão de outro, (moldar-se de acordo com), destrói a centralidade do evangelho porque o “mundo jaz no maligno”; e o que aceitamos do mundo, da cultura dentro da igreja, se pensamos da mesma forma que o mundo, ou se tentamos chegar à verdade da mesma maneira que o mundo tenta, isso é ácido corroendo aos poucos a fé, a verdadeira fé, corrompendo até a forma de se ler a Palavra de Deus.
Fazer algo dentro da igreja por que o culto fica bonito aos nossos olhos, ou por que a tal igreja está fazendo e se tornou sucesso, ou costume, a cultura, ou a prática da igreja x ou y, não deve ser o nosso modelo, por que este modelo somente deve ser Cristo e a sua Palavra revelada: não vá além do que está escrito. Paulo novamente alerta:
Paulo aos Colossenses 2:8  “Cuidado que ninguém vos venha a enredar com sua filosofia e vãs sutilezas, conforme a tradição dos homens, conforme os rudimentos do mundo e não segundo Cristo;”
Quando olhamos para o Novo Testamento, não vemos um culto solene sequer que nos sirva de exemplo para as badernas a que chamam de culto nos nossos dias. Os cultos de hoje cada dia mais estão se parecendo com espetáculos musicais, onde existe uma banda que toca e se veste nos mesmos moldes do mundo, e então o chamado ministro de louvor age como se fosse um animador de auditório. “E fique em pé, e levante a mão, agora bata palmas”. Não se vê este tipo de coisa na bíblia... se vê nos programas de auditório, no Silvio Santos, no programa do Gugu, do Ratinho, seja lá de quem for, e onde for, menos na Escritura.  Estamos trazendo o mundo para dentro da Igreja. Não estamos inserindo rudimentos do mundo no culto à Deus?
Os modelos que vemos de cultos solenes mostradas no Novo Testamento eram calmos, sem expressões exageradas, ou até mesmo desordenadas, como se alguém precisasse de por para fora algum sentimento recalcado. Parece que foram ao consultório do psicólogo e ouviram dele que não se deve guardar sentimentos, mas pô-los para fora. Realmente isso deve ter o seu valor, mas o culto não é lugar disso.
Não encontramos muito menos na bíblia, alguma demonstração de libertação de adrenalina nos cultos do Novo Testamento. O culto solene é lugar de louvar a Deus, e louvar a Deus é exaltá-lo pregando e cantando seus atributos, e não os nossos. Adorar a Deus é viver uma vida santa diante de Deus e esta tem de ser para o verdadeiro cristão a única motivação necessária para vir à Igreja aos domingos e louvar a Deus com todo entusiasmo.
Se você acha que precisa de motivação na hora do culto para louvar a Deus, tem algo errado. A luz vermelha se acende como alerta de que seu foco de adoração e seu foco de motivação para o culto estão fora daquilo que Deus requer de cada um de nós.
Se você não sente motivação para louvar a Deus da forma mais simples possível, até mesmo acapela, ou seja, sem instrumento algum, recomendo fortemente que você comece a vasculhar sua vida e ver como anda sua vida diante de Deus. Se você sente vontade de adorar ,ou mais animado, só se houver aquele " animador de auditório, ou aquela banda"; Veja se não tem um pecado escondido por aí. Perceba se não tem um pecado que não foi confessado... Ou caia na real e tente ver se a conversão que você passou não foi uma conversão psicológica ao invés de uma conversão espiritual.
Temos culto no NT, onde se cantou apenas um hino após a exposição da Escritura e mais nada, como vemos na última ceia de Cristo em Marcos 14.26. quando ao término da ceia, cantaram um hino e saíram. Simples e objetivo.
Estamos falando de culto, mas afinal o que é? latreuw latreuo
de latris (criado assalariado); TDNT-4:58,503; v

1) servir por salário
2) servir, ministrar, os deuses ou seres humanos. Usado tanto para escravos como para homens livres
2a) no NT, prestar serviço religioso ou reverência,
2b) desempenhar serviços religiosos, ofertar dons, louvar a Deus na observância dos ritos instituídos para seu louvor e  adoração
2b1) dos sacerdotes, oficiar, cumprir o ofício sacro

Paulo recomenda veementemente aos coríntios que o culto a Deus deve ser algo ordeiro, sem exageros, que deve haver um comportamento que não cause espanto para ninguém, especialmente para os que ainda não se converteram. (Cf. I Co capítulos 11 a 14, principalmente em 1 Coríntios 14:40  Tudo, porém, seja feito com decência e ordem.)
O culto deve ser algo tão solene, que Paulo quando recomendou aos Coríntios acerca das mulheres que não estavam usando o véu, disse que o problema não era o uso ou não do véu. A questão central era que a falta do véu estava causando mal estar nos homens, e nas mulheres que não abdicaram de usá-lo. E isto nós vemos no capítulo 11. 16 nos mostra que o motivo não era espiritual, mas de “costume”.   
As mulheres que não estavam usando o véu estariam sendo confundidas com prostitutas. O que aquelas mulheres que não estavam usando o véu faziam era trazer para dentro da igreja um comportamento que aflorava no mundo, estavam se moldando ao mundo, moldando-se à cultura local, e isso não fazia parte do costume da Igreja.
Algumas mulheres da cidade de Corinto haviam se rebelado contra o uso do véu por que era sinal de submissão ao marido. A questão que estamos discutindo aqui, neste momento, não é a validade, ou não, da submissão, mas que estavam trazendo um modelo do mundo para dentro da igreja. Esta é a questão.
O princípio que podemos aprender aqui é que se existe algo no culto que para uns não tem nada de mais, para outros pode causar escândalo.  E se pode causar escândalo ao próximo então o culto passa a ser pedra de tropeço ao invés de abençoar. Se comer carne de sacrifício pode causar escândalo ao meu irmão, então não devo comer carne por causa da consciência dele, não da minha.
Romanos 14:21  É bom não comer carne, nem beber vinho, nem fazer qualquer outra coisa com que teu irmão venha a tropeçar ou se ofender ou se enfraquecer.
Sabemos que todas as coisas pertencem a Deus, e que tudo que ele abençoou ninguém pode dizer o contrário. Por isso, se eu deixar de fazer algo, mesmo que eu goste e me faz sentir bem, e que irá fazer com que meu irmão, ou meu próximo não fique escandalizado, então é melhor eu deixar de fazer, do que fazer o que quero e escandalizar a meu irmão.
E se proceder de maneira mais amena no culto vai abençoar ao meu irmão, eu devo abdicar de fazer aquilo que acho que não tem nada a ver do que servir de pedra de tropeço para ele.

Conclusão
Qual então o modelo ideal de culto?
A bíblia não nos dá um modelo de culto. Apenas nos mostra elementos que são essenciais no culto.
O salmo 50 nos mostra que a centralidade do culto está quando Deus fala. A Palavra de Deus é a centralidade no culto. Muitos concordam com essa idéia, a imensa e grotesca maioria dos pastores evangélicos de todas as linhas concordam com isso; contudo não é o que acontece na prática, pois nos cultos de suas igrejas, canta-se uma hora e prega-se quinze minutos.
O primordial elemento do culto é a pregação.
Outro elemento que podemos ver é a questão do perdão dos pecados. Lembrar do sacrifício de Cristo na cruz é admitir seus pecados e pedir perdão por eles. Como vemos na pregação de Pedro no Templo após a cura de um coxo. O foco não foi a cura do coxo, mas o anuncio do evangelho e logo após ouvida a pregação, Pedro enfatizou o arrependimento dos pecados. Conforme vemos em Atos 3.19.   Este elemento do culto é o momento de contrição pelos pecados.
A música também faz parte do culto, não por si só, mas com a intenção de louvar e glorificar a Deus, e não a nós mesmos como nos mostra o  Salmo 40.3. E como vimos hoje pela manhã, o louvor é quando eu me levanto e louvo a Deus pelo que Ele é, e não pelo que Ele pode fazer por mim, o que Ele pode me dar. E isso, não da minha maneira, mas da maneira prescrita na Escritura.
Como já vimos em I Coríntios o culto deve ter uma ordem e Mateus 26.30 nos mostra que os cânticos fazem parte desta ordem, não que a música deve vir por último, mas que ela é um dos elementos do culto e não o principal deles.
Como anda nosso culto a Deus? Tem sido do modo que eu gosto? Do modo que minha igreja está acostumada? Do modo que a igreja gosta? Ou tenho me baseado na Palavra? Sabem por que muitos cultos não mudam mesmo que o dirigente da igreja sabe da verdade? Por que dá trabalho, e não vai influenciar na minha salvação ou na do próximo. Será mesmo?
Quando termina o culto solene eu fico satisfeito comigo mesmo? Quando termina o culto o membro sai de lá satisfeito com ele mesmo? Se o culto satisfaz a mim, ou o membro de minha igreja, e nós não saímos do culto com a verdadeira noção de que sou pecador carente e necessitado de Deus, se eu não reconheço que sou miserável, pobre cego e nu diante da grandiosidade de Deus, então o meu culto tem sido um culto pagão, porque é um culto que exalta o homem e não a Deus. Então temos de repensar no nosso conceito de culto.
E como anda a nossa vida cúltica? Nossa adoração a Deus? Estamos satisfeitos com o andar de nossa santificação? Também hoje pela manhã vimos que a adoração a Deus é o modo como eu me curvo diante da santidade de Deus, como eu vivo uma vida de servo diante de Deus, é como eu demonstro que de fato Cristo é Senhor em todas as áreas de minha vida.
Pregação, arrependimento, louvor, não deve ser o que me motiva para viver durante a semana. É justamente o inverso. O viver de adoração a Deus durante a semana, minha vida devocional com Deus em meu lar, sozinho em casa, ou no convívio com a família, é que deve nos levar a repensar as nossas vidas a maneira como nos comportamos, e isso tem que trazer modificações nos nossos padrões de comportamento, na nossa atitude diante de Deus, diante do meu próximo; modificações no nosso modo de pensar, e modificações naquilo que fazemos. E esta deve ser tão somente nossa motivação, único fator motivador para chegar ao culto, e por mais simples que este culto aconteça, eu esteja tão motivado pelo viver com Cristo, que saio da igreja tendo a certeza de que Deus recebeu a devida adoração e louvor ao seu nome, e certo de que Seu nome foi glorificado conforme Ele mesmo requer, pela mediação de Cristo, pelos méritos de Cristo, somente.  
Quando procedemos desta forma, vivendo uma vida santa de adoração a Deus e chegamos ao culto solene de modo a exercer um culto racional, lógico, que é uma vida coerente com aquilo que se diz ser, e me alegro em satisfazer a vontade de Deus e não a minha no momento de culto, Paulo nos diz que isso é o que vai nos mostrar de fato e muito mais do que isso, vai fazer com que nós vivenciemos, experimentemos a boa perfeita e agradável vontade de Deus.

Que Deus tenha misericórdia de nós.